Diário dos Açores

O facto, o número e o nome

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Olhar do Sul

O facto...
As sessões plenárias 
Seja por razões profissionais, seja por curiosidade cidadã, assisto com alguma regularidade aos debates produzidos mensalmente em sede da Assembleia Legislativa Regional dos Açores (ALRA).
Agora, fazendo-o de longe, ganharei em equidistância, perdendo, porventura, em detalhe e informações internas que possam valorar e potenciar as opções estratégicas dos diversos grupos e representações parlamentares.
Partamos de um princípio indissociável da condição de deputado: a defesa da população responsável pela sua eleição, seja num círculo mais restrito de ilha, seja numa perspetiva mais ampla de região. Esse é o ponto de partida que, do ponto de vista ético, deve nortear todos e cada um dos 57 parlamentares açorianos.
Um número exagerado, desproporcionado para uma região de nove ilhas e um total de 250 mil habitantes, e que nem a aludida (e muito defendida…) proporcionalidade indispensável consegue justificar. É gente a mais, gasto a mais para o erário público e, sobretudo, uma despesa que, na prática e na dinâmica dos trabalhos parlamentares, não se justifica.
Pretende-se que o painel de eleitos seja representativo do seu tecido demográfico, que seja verdadeiramente comprometido com as causas e com os cidadãos. Verdade seja dita: há deputados e deputadas com essa visão, essas qualidades e essa disposição.
Mas há “eleitos”, no parlamento açoriano, que nunca deveriam estar sentados nas cadeiras de representação popular.
Assistir à difusão televisiva ou por plataforma digital das sessões plenárias chega a ser pungente, tal a quantidade absurda de argumentos falaciosos, de chicana política e partidária pura, de arremesso mútuo de argumentos fúteis, de descontextualização e de aproveitamento pessoal.
Lembro-me com recorrência da ideia com que alguém ficou, após, durante algum tempo, ter passado pelos “corredores” do parlamento açoriano: se o partido “A” tem, de manhã, uma proposta com a qual o partido “B” concorda, o partido “B”, à tarde, encontrará argumentos para a questionar.
É, no fundo, a velha questão que amarra muitos dos “políticos” açorianos: pensar que do nosso lado estão todos os bons, e que do lado oposto estão todos os maus. Uma cretinice que o eleitor, inteligente e atento, começa a não deixar passar…

O número
13
A simbologia do número tem, na história e nos detalhes das aparições de Fátima, um contexto muito especial.
Se o 13 é, para muitos, sinónimo de azar, de nuvens negras no horizonte ou, simplesmente, um número para esquecer (muitas companhias aéreas, por exemplo, optaram por abolir as filas 13 dos seus aviões…), em Fátima é sinónimo de esperança e paz.
Mesmo para os não crentes (grupo no qual me incluo), o santuário, na sua imensidão, na sua claridade e na sua simplicidade, é verdadeiramente um espaço de reflexão para a ética e para a cidadania, um ponto de encontro de mundivisão e igualdade em todas as diferenças, um apelo permanente à paz.
Ao contrário de outras manifestações peregrinas, Fátima não concentra atenções numa imagem, antes partindo dela para dar as mãos e apelar à quebra de fronteiras.
É este extraordinário fenómeno de agregação humana em torno de ideais que em muito extravasam a componente puramente religiosa, concentrando-se numa estrutura de pensamento superior, cidadão, humanista, equidistante e equivalente, que fazem de Fátima e das suas peregrinações um permanente exemplo para a igreja católica e para muitos dos seus responsáveis.
Sendo única, agregadora e multiplicadora.

O nome
João Rendeiro
Fui na manhã de hoje (sexta-feira), surpreendido, em Joanesburgo, com um muito matinal telefonema de Lisboa: “o Rendeiro matou-se”.
Tirando o ar estremunhado da hora matinal, não consegui esboçar reação de surpresa perante o aparente suicídio do ex-banqueiro.
Detido há seis meses numa das prisões de mais alta segurança mas, por isso mesmo, de maior risco e indisciplina interna da África do Sul, João Rendeiro tinha confidenciado, a alguns amigos mais chegados, que, entre todas as opções que se lhe colocavam num futuro próximo, o suicídio era seguramente uma delas.
Percebendo-se a vida de Rendeiro, facilmente se conclui que esta probabilidade, mais do que ser apenas “uma delas”, foi ganhando consistência nos últimos meses, com a sua continuidade em detenção, com o adiamento para junho do início do julgamento e com a sucessiva degradação do seu estado de saúde (certamente também psicológica).
Um homem é um homem, independentemente da sua condição social, ideológica ou financeira.
A ironia da história de vida de João Rendeiro é o seu próprio percurso de vida. E o seu próprio recurso de morte.

Rui Almeida 

 Jornalista e Apresentador de Televisão
Joanesburgo, 13 de maio

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