Diário dos Açores

Diocese: A missão dos media

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É sempre com expetativa que recebo semanalmente o centenário semanário A CRENÇA que se publica em Vila Franca do Campo. Fundado pelo Pe Ernesto Ferreira, agora sob a Direção do Pe José Paulo Machado, doutorado em Ciências da Comunicação pela Universidade Católica Portuguesa, o jornal constitui uma lufada de ar fresco no universo da imprensa de inspiração cristão.
A liberdade, a seriedade e a frontalidade com que os temas e problemas eclesiais são abordados, poderão não agradar à estrutura diocesana e clerical, e dessa insatisfação já houve manifestação de repúdio. Mas o apelo do Papa Francisco a uma escuta permanente e a defesa da sinodalidade como fator de mudança e de resposta à problemática da Igreja e dos homens, dão-nos a certeza de que o tempo da Inquisição, do Santo Ofício e das excomunhões, deu lugar à Força do Espírito que age na Igreja, onde, quando e como quer.
A permanente crítica do Papa ao clericalismo e a mudança operada na Cúria Romana com a chamada de leigos, nomeadamente de mulheres, para cargos de conselheiras e responsáveis pelos mais diversos misteres revelam a nova face que Francisco pretende para a Igreja.
Vai nesse sentido a linha editorial d’A CRENÇA e de outros meios de comunicação social de “inspiração cristã” que questionam, debatem, escutam e informam livremente, “doa a quem doer”, como acontece nos casos de pedofilia.
Há ainda quem mantém um entendimento antigo sobre os conteúdos informativos e o modo de transmitir a mensagem evangélica, a atividade eclesial e a visão cristã do mundo. Alguns media continuam a divulgar e incentivar  um pietismo individualista e um espiritualismo desenraizado da vida, baseados numa visão distorcida da Fé, da santidade e da Piedade, contrárias à doutrina de Jesus. Ignora-se os apelos evangélicos à Missão, à Caridade, à fraternidade, à solidariedade, à justiça e à paz entre TODOS os homens, o que redunda num imobilismo que contraria as Bem-aventuranças.
Essa imprensa é mensageira de rituais, cerimónias e devocionários ultrapassados e bafientos, dos costumeiros e anacrónicos espetáculos processionais, onde muitos batizados não se revêem nem participam, pois não traduzem a vivência comunitária e transformadora da Fé.
Muita informação dita religiosa e das redes sociais que a suportam, são o espelho de um Deus distante, castigador, e de uma igreja de pendor maniqueísta, onde só os “bons” acedem e são recompensados e os maus castigados para sempre. Esta mentalidade anti-evangélica, associada a uma liturgia clerical, ritual e desadequada aos novos tempos e mentalidades, é uma das causas por que muitos católicos não se sentem atraídos pela prática religiosa.
Há dias, o Papa Francisco recordou aos responsáveis pelo movimento Shalom que “É o Espírito Santo quem faz viver a Igreja – não o esqueçamos. E isto acontece sobretudo na oração, de maneira especial na Liturgia”. E acrescentou: “ A Liturgia não é uma bela cerimónia, um ritual em que os nossos gestos ou, pior ainda, as nossas vestimentas são o centro. Não! A Liturgia é ação de Deus connosco e devemos estar atentos a Ele: a Ele que fala, a Ele que atua, a Ele que chama, a Ele que envia.”
Quem estiver atento às redes sociais comprova o tradicionalismo que grassa na divulgação das celebrações festivas das nossas comunidades.
Quantas celebrações litúrgicas festivas em louvor de Padroeiros/as, que deveriam ser momentos de fortes de compromissos comunitários, são noticiadas com pompa e circunstância apenas pela sua componente externa, pelas luzes tapetes e decorações, quando o mais importante era a transmissão da Palavra e a sua tradução na vida paroquial?
Para a História religiosa da Diocese, as imagens das festividades religiosas, sensivelmente iguais ano-após-ano, são os únicos documentos da Fé do povo e não os testemunhos de fé e compromissos de quem neles participa.
Projeta-se o som das filarmónicas e o brilho das luzes e desvaloriza-se o diálogo individual, íntimo e transformador com Deus que dinamiza as paróquias e a ação missionária.
Desses Sinais raramente dão conta os media ligados à Igreja. E seria importante que o fizessem, para troca de experiências e modos de atuação e para mobilizar outros agentes pastorais que, embora agindo no silêncio, são testemunhos valorosos de como a Fé se traduz em obras, sobretudo junto dos mais periféricos e abandonados da sociedade.
A imprensa de inspiração cristã nas plataformas materiais passa por uma profunda transformação.
Ainda há dias, soube-se do encerramento da revista Família Cristã, invocando-se a quebra de assinantes e os custos de produção.
Na Diocese, o vespertino A UNIÃO, fundado em 1893 por Vieira Mendes, encerrou há uma década, depois de o mesmo ter acontecido em 2007 ao “Correio da Horta” e a alguns jornais paroquiais como o “Bom Combate”, da Madalena e “Ecos do Santuário” de São Mateus do Pico.
Resistem A CRENÇA e O DEVER das Lajes do Pico, sob administrações paroquiais e com as dificuldades decorrentes nos meios pequenos do número de assinantes e da publicidade.
Será que a Diocese conhece e interessa-se por essas situações? Ou optou apenas por um programa semanal de rádio na Antena 1-Açores, que podia também ser transmitido pelas rádios locais açorianas, algumas delas de “inspiração cristã”?
Pelo mundo fora existem agências noticiosas de informação religiosa, ao alcance de um clique.
“Zenit” – o mundo visto de Roma - é uma agência de notícias internacional, “sem fins lucrativos, formada por uma equipa de profissionais e voluntários que  transmite a mensagem do Papa e da Igreja”1, em cinco línguas, exceto português.
“Religion Digital.org”, é “o principal portal de informação religiosa em castelhano, no mundo, a funcionar desde o ano 2000. É visto em 194 países e tem mais de 5 milhões de visitas mensais. Apoia declaradamente as reformas do Papa.2 Tem um número de credenciados colaboradores e teólogos espanhóis e cobre um largo espetro de temas religiosos, sociais e políticos, pelo que merece muita credibilidade.
Em Portugal o “7Margens” é um jornal digital dirigido pelo jornalista António Marujo “orientado por critérios jornalísticos profissionais e independente de qualquer instituição, religiosa ou outra. Divulga informação sobre o fenómeno religioso, no sentido mais amplo do termo, não se confinando à atualidade das diversas confissões e crenças estabelecidas.”3
Não posso esquecer a agência de notícias do Vaticano (https://www.vaticannews.va/pt/igreja.html), pela universalidade e qualidade da informação transmitida. É, na verdade, um bom exemplo da importância que o Vaticano dá à atividade da Igreja universal, nas dioceses mais recônditas do planeta.
Que importância atribuirá o futuro Bispo da Diocese às potencialidades dos media para a divulgação da mensagem bíblica, da Doutrina Social da Igreja, do pensamento do Papa e para a educação e mobilização dos fiéis para a Missão?
Também neste âmbito, a Diocese necessita de uma “excelentíssima reforma”.

1    https://es.zenit.org/
2    https://www.religiondigital.org/
3    https://setemargens.com/sobre-nos/

 

*Jornalista c.p.239 A
http://escritemdia.blogspot.com

José Gabriel Ávila*

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